Outra entrevista a um dos nomes grandes de Holywood, Lin-Manuel Miranda, protagonista de O Regresso de Mary Poppins, acabadinho de estrear. Miranda é o homem do momento na Broadway mas também uma aposta grande do cinema americano. Cantor, músico, dançarino e letrista, este norte-americano de origem puerto-riquenha já ganhou um Emmy,  um Grammy, um Tony e um Pulitzer. Está este ano nomeado para os Golden Globes como melhor ator, mas contou-me que não faz a mínima ideia de como isso funciona.

Rui Pedro Tendinha- Este é o teu primeiro grande papel no cinema. Como todos sabemos, vieste dos palcos da Broadway e o que te pergunto é se tiveste a necessidade de treinar a relação com uma câmara? Pensaste também em baixar o tom da voz no plateau ou algo do género?

Lin-Manuel Miranda- Não pensei em nada disso nem estive preocupado se o meu tipo de representação tinha de mudar. O que fiz – e recomendo a todos que tenham a mesma oportunidade que tive- foi confiar no Rob Marshall, que não só é um dos maiores realizadores de musicais da história, como é alguém que também vem do teatro. Foi por isso que fui escolhido! E aqui limitei-me a confiar nele e deixar-me ser guiado. Lembro-me de ser o puto que viu Chicago no extinto Ziegfield numa sessão da meia-noite e nem queria acreditar – aquele filme parecia um truque de magia na maneira como adaptou aquela peça! O Rob faz sempre isso quando adapta para o cinema os musicais. Mas tivemos um “boot camp” de nove semanas, sempre a ensaiar! A minha química com a Emily Blunt foi construída enquanto aprendia as canções e as coreografias. Além do mais, o Rob é daqueles tipos da velha guarda que te diz que consegues tudo. Dizia-me sempre que eu era o único ator no mundo que poderia fazer este filme. Obviamente, isso dá-nos mais confiança, trata-se mesmo de uma maneira maravilhosa de trabalhar. Sentia-me o maior!

Já agora, és daqueles artistas que tem sempre na cabeça as letras e os passos de cada canção e coreografia?

É curioso que me perguntes isso pois vou agora em janeiro para Porto Rico com o espetáculo Hamilton, onde vamos ter sessões de beneficência para combater os estragos do furação Maria durante 3 semanas. E sabes que mais? Não sei as letras todas! O que é uma vergonha, tendo em conta que fui eu quem as escrevi! A razão prende-se com o facto de já não representar esse musical há 2 anos e meio…Todavia, sei que mal ponha os figurinos e esteja ao lado de todos aqueles atores formidáveis, há muita coisa que vai voltar à minha cabeça. É isso que faz a música ser algo tão extraordinário. Não é por acaso que ouvimos casos de pessoas com perda de memória grave que são capazes de assobiar a melodia de um tema que ouviram na infância. Enfim, a música fica alojada em nós num local profundo. Igualmente é por isso que digo que o primeiro Mary Poppins ficou dentro de todos nós. Todas aquelas canções estão num local precioso onde armazenamos as nossas melhores memórias. Espero que O Regresso de Mary Poppins faça o mesmo para uma nova geração.

Qual seria neste momento um bom musical da Broadway para uma adaptação ao cinema?

Ouve, estou à espera de tantos!! Mas o mais difícil é adaptar um bom musical para o cinema… Por isso digo que o Rob Marshall é extraordinário! Começou por fazer o mais complicado: Chicago, que em cinema tinha tudo para não resultar. Devido ao seu brilhante conceito de inventar números de dança de fantasia na cabeça das personagens, tudo acabou por sair muito bem! Chicago é uma exaltante peça de cinema! Estou empolgado com o Jon Chu, que vai adaptar o meu primeiro espetáculo, o In The Heights. Nesta altura, estamos a escolher o elenco e a ideia será filmar fora de estúdios, em plena Washington Heights! Vou poder ir para o trabalho a pé! Ainda vivo nessa zona!!

Mas não há nenhum papel para ti, pois não?

Não, mas provavelmente vou ter um “cameo” à Hitchcock. Foi a maior alegria da minha vida ter estado nesse musical e agora estou empolgado para ver quem vai ficar com o papel. Tenho também de elogiar o Chu, que é um especialista a conceber sequências de dança. Sou o tipo que foi ver Step Up 2 nos cinemas mal estreou! Fiquei também muito entusiasmado com aquilo que fez em Crazy Rich Asians – Asiáticos Ricos e Doidos, sobretudo pelas escolhas dos atores. Espero que ele consiga o mesmo para o In The Heights. O filme terá muitos atores…Queria um cast com lendas e com futuras lendas. Estou tão empertigado com este projeto. Creio que será o meu segundo da escola de cinema.

O que queres realmente dar ao cinema?

A minha vida agora é um mix entre dizer que sim a certas oportunidades que me dão e a continuar a ouvir as vozes que estão na minha cabeça e as ideias que gero. Tenho de saber encontrar aqui um equilíbrio. Por exemplo, passei este verão na rodagem da série His Dark Materials, baseada nos livros do Pullman, que li numa fase da minha vida em que estava a ficar apaixonado por aquela que é hoje a mulher da minha vida. Apaixonámo-nos enquanto líamos estes livros. Tinha de aceitar este convite…Mas vou querer continuar a escrever, sempre que puder.

Vais estar ocupado, estou a ver…

Sim! Mais vale assim do que não trabalhar…Entre atarefado e desempregado, escolho atarefado.